quarta-feira, 7 de março de 2007

a long way from home

Já não reconheço meus desejos, a ponto de acreditar que não tenho nenhum; os dias tardam, cada hora se alonga em demasia. O que falta me envenena lentamente, até que eu sinta falta das garras do monstro que anteriormente rasgava minha carne. Era vida, era pulsação, perturbação; era mais do que essa falta, essa ausência maldita que se espalha pelas minhas células, tomando posse do que um dia foi meu e somente meu reino.

Hoje não tenho corpo, célula, vontade ou reino, tenho este vácuo que se espalha sem restrição, avançando e destruindo tudo o que lateja. Mantenho-me a distância de mim, desse eu cinza e lúgubre que a nada e por nada se perturba. Se eu chegar perto, temo ser violentamente tragada pelo vazio que hoje sou eu. E é quase como se eu fosse duas, dissociadas - a esvaziada e a órfã. Esperança e ilusão foram meus pais e sinto que os perdi cedo demais; não tenho porto, não tenho abrigo ou referências. Não tenho vontade.

Não tenho pais e a minha é uma casa devastada, cujos móveis maltratados espalham-se desordenadamente pelos cômodos entristecidos. As paredes descascam, o assoalho descorou-se há muito. O que resta dos tapetes roídos é de cor esmaecida e triste e um vento frio insiste em me castigar a cada vez que ouso passear pelos corredores do que um dia foi meu lar.


Sometimes I feel like a motherless child
from « American Negro Spirituals»
by J. W. Johnson, J. R. Johnson, 1926

Sometimes I feel like a motherless child
Sometimes I feel like a motherless child
Sometimes I feel like a motherless child
A long way from home...

Nenhum comentário: