Por horas, eu perdi o controle e rompeu-se o tênue fio que me segura à beira da razoável; estive além do limite do suportável, transtornada por tudo que é excessivo, exaustivo e incansável no decorrer da vida que eu ainda não sei se é minha.
E eu, que tanto temo a loucura, percebo que andamos lado a lado. Esta noite, sucumbi a seu encanto hipnótico e quase fatal. Esta noite, eu perdi meu eu e meu corpo mexia-se à mesma velocidade que meus pensamentos. Nesta noite, o sono não veio, a despeito daqueles que induzem ao sono e roubam meus sonhos - os sedativos. Mas, nesta noite eles não me concederam a pequena morte. Guiado pelo cérebro parte entorpecido, parte acelerado, meu corpo debateu-se por todos os cômodos desta casa-prisão, com minhas transtornadas pernas sendo o mais fiel retrato das minhas embaralhadas sinapses.
Inquietas, ansiosas, eu queria as cortar fora, estas pernas que eram excrescência maldita, a me perturbar por intermináveis segundos, minutos, horas! Eu grito, eu choro, eu oro para este céu vazio! para o Deus piadista! Eu choro, eu imploro, o cachorro late, as crianças se assustam. Como ébria, como maníaca, ando aleatoriamente pelos quartos e choro: por favor, eu só quero dormir, eu só quero que minhas pernas fiquem em paz. Que a cabeça seja essa tormenta, mas que o corpo descanse! E o Deus que não existe ri, satisfeito. Vêm os remédios, vêm o sono - o pequeno torpor. Não vem o esquecimento e, ao despertar, imediatamente me lembro que os mesmos dias miseráveis esperam por mim - e pelas minhas pernas.
Esta vida me vem como avalanche, como vulcão em erupção - a lava me persegue e corro, corro além do limite das forças que já foram exauridas - eu corro. Para salvar isto - isto, a que chamo de mim - eu fujo, usando energia que eu não tenho. E tal energia é confundida com ânimo, persistência e vitalidade. Pior: com vontade.
Não! Que eu só tenho vontade de ser engolida pela lava e finalmente cremada. Ainda que eu não renasça, ainda que eu me acabe com as cinzas que o vento há de dispersar por terra sem dono. Ainda que a fênix seja nada mais que lenda.
Que a lava me destrua, derreta este corpo de ave-Frankenstein, essa colcha de retalhos de pedaços de cadáveres - que meu corpo seja queimado. Não preciso do grande espetáculo, da explosão, das faíscas. Que imediatamente derreta, se funda à lava - pouco importa se nem cinzas sobrarem.
Importa é que o vulcão seja meu, que sua lava venha a mim e, tal qual manto dourado e laranja, abrigue e incendeie este costurado corpo morto, antes que a insanidade o faça.
sábado, 10 de março de 2007
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